segunda-feira, 25 de junho de 2007

"La buena intención"

Má Educação (La mala Educación, 2004)
Pedro Almodóvar
Cotação: 7/10



*Como vou comentar algumas partes, talvez seja bom para quem não assistiu não ler.

Má educação foi decepcionante. Não por se tratar de um filme ruim - ruim ele não é, mas por, como toda “boa” decepção, ter se chocado com as expectativas geradas com relação a ele.

O filme narra a história de Ignácio Rodriguez (Gael García Bernal), um ator que procura o antigo amigo – e amor - Enrique Goded (Fele Martínez), para mostrar-lhe um roteiro chamado “A visita”. Enrique, que no momento é um cineasta sem idéias para o próximo filme, se encanta pelo roteiro e decide filmá-lo. O enredo de Má Educação se desenvolve intercalando a leitura de “A visita”, cenas do filme gerado por este texto e dias atuais dos personagens.

Tamanha complexidade narrativa é questionável, pois da forma que foi desenvolvida deixou os personagens extremamente vazios, o que enfraqueceu vários outros setores do filme, como as atuações e os argumentos. Inclusive, a idéia principal do filme não consegue ser cumprida. A tentativa de justificar a atual postura de Ignácio como fruto de seu passado e dos abusos sofridos dentro de um rigoroso colégio católico esbarra no desvio de atenção ao qual somos submetidos no constante vai-e-vem da história.

Outros dois momentos questionáveis do filme são: a atitude de Enrique quando descobre a verdade sobre “Angel” através da mãe do ator e revela posteriormente que fingiu não saber da verdade “para ver até onde o rapaz iria” (????) e a decisão repentina tomada por Juan de matar o irmão – um personagem até então absolutamente passivo de repente se transforma em um assassino?

Apesar de tudo a crítica à Igreja Católica é bem-vinda. Presa a velhos preceitos, ela mantém uma atitude absurda de tentar ignorar os avanços da sociedade e se esconde na hipocrisia de suas instituições, fingindo não saber que já se corrompeu por dentro. É mesmo uma pena esse ter sido mais um ponto a ser mal desenvolvido por Almodóvar.

Ficam os elogios à iniciativa de discutir no cinema um tema tão polêmico e os créditos pelos recursos visuais característicos do diretor e que me agradam muito.

Postado por Andressa Cangussú

quinta-feira, 14 de junho de 2007

Podridão Interior

O Cheiro do Ralo (Idem, Bra, 2006)
Dir: Heitor Dhalia
Cotação: 8/10

Depois de sua estréia com o denso Nina, o diretor Heitor Dhalia lança O Cheiro do Ralo. Seu filme possui uma elevada importância no panorama atual do cinema brasileiro pois se apropria de uma liberdade narrativa poucas vezes vista nas produções nacionais para adaptar a obra literária homônima. Dessa forma, chacoalha o nosso cinema com uma obra super inventiva.

No filme, Lourenço é um homem amargo e frio que tira seu sustento da compra e revenda de objetos usados. Ele sempre faz questão de explicar a todos os seus clientes que o cheiro ruim de seu escritório provém do ralo do banheiro. No entanto, descobriremos que a origem daquele odor fétido se revela vindo dele próprio.

Lourenço é um personagem sujo. Afeto é algo que lhe falta. Trata seus clientes com arrogância ou simpatia, dependendo do momento. Acostumado a avaliar tudo como mercadoria (tudo para ele tem um preço), encontrará dificuldades ao se envolver com uma garçonete, cuja bunda se torna um objeto de culto para ele. Na realidade, em sua obscenidade demente, ele só tem olhos para a bunda e nada mais. A moça até tenta se aproximar de forma mais amorosa, mas isso é algo que ele desconhece. Assim, a paranóia cresce ainda mais em sua cabeça.

Selton Mello é o destaque no papel principal criando seu personagem na medida exata entre o humano e o grotesco, o insano. Ao mesmo tempo, é possível criar identificação com Lourenço, pois toda sua perturbação parece vir de um problema de família (mais especificamente a ausência da figura do pai). Além disso, somos apresentados a outros tantos personagens esquisitos que surgem na tela.


Competente também é toda a estrutura técnica do longa (que nada fica devendo a grandes produções comerciais). Da fotografia escura em tom amarronzado (acentuando o aspecto de sujeira e de coisa antiga) até a trilha sonora pop e descompromissada.

Irreverente como poucos, O Cheiro do Ralo consegue construir uma narrativa grotesca sem medo de parecer experimental e escrachada. Filme feito para perturbar e que traz, por incrível que pareça (impossível esquecer o trocadilho), bons ares à cinematografia brasileira.

Postado por Rafael Carvalho

sábado, 9 de junho de 2007

E bota Fabuloso nisso!

O Fabuloso destino de Amelie Poulain, (Le fabuleux destin d'Amélie Poulain, 2001)
Dir: Jean-Pierre Jeunet
Cotação: 10/10


Assisti Amelie Poulain há umas duas semanas e desde então me vejo atormentada pelas tentativas frustradas de escrever algo sobre o filme. Afinal, ficar sem palavras é o pior que pode acontecer a alguém que pretende manter um blog sobre cinema.

O que mais me chamou a atenção no filme foi que não tem a pretensão de “salvar o mundo” através de uma mensagem de vida - diferente do que ocorre com a maioria das películas que têm algo a transmitir. A história corre leve, interessante em cada detalhe e é impossível não adentrar no mundo de Amelie desde o maravilhoso começo, onde acompanhamos o início de sua vida.

Os cenários e figurinos, todos com o predomínio do vermelho e do verde, compõem de forma maravilhosa todo o ambiente do filme, assim como a fotografia, os efeitos de câmera e a ótima trilha sonora “à francesa” (foi inevitável o infame trocadilho!).

O filme encanta pela simplicidade, em contraste com as idéias mirabolantes da protagonista. As soluções encontradas por ela para ajudar os outros são surpreendentes! Destaque para o meio que Amelie encontra para fazer o pai viajar pelo mundo, fantástico! Interessante também a identificação dos personagens através dos gostos de cada um. Existe forma melhor que essa de conhecer alguém em poucos segundos?

A interpretação de Tautou não poderia passar despercebida. É simplesmente impecável e dá aquela sensação boba de que aquela não é apenas uma personagem, mas uma mulher fascinante que realmente existe em algum lugar – mais um pensamento exacerbado de alguém que se encantou pelo filme.

Depois dessas impressões iniciais, passei a compa
rar as atitudes de Amelie às minhas e às das pessoas que conheço. Enquanto a moça, na primeira parte do filme, leva uma vida desprovida de grandes emoções, supridas somente por pequenos prazeres, nós perdemos tempo com o extremo oposto dessa atitude: mergulhamos na correria do dia-a-dia e deixamos passar oportunidades de fazer coisas bobas que nos fazem bem (A quanto tempo não deito na grama do quintal, nem faço brigadeiro de panela e como até enjoar...?).

E então, qual o seu pequeno prazer?

PS: Aproveito para entregar o que Rafael me confessou quando falei do filme com ele: cortar o pote de iogurte depois que acaba e passar o dedo na embalagem! (Iogurte de ameixa)
Postado por Andressa Cangussú