Ó Pai, Ó (Idem, 2007)
Dir: Monique Gardenberg
Cotação: 7/10
No último dia de Carnaval em Salvador, a dona de um cortiço no Pelourinho corta a água do local por falta de pagamento do aluguel. A confusão que se forma pelos moradores é só mais uma diante dos perrengues e situações que cada um tem para contar. Talvez isso tudo seja somente um pretexto para que a diretora Monique Gardenberg (Benjamim) mostre um pouco da vida dessa gente. Na realidade, os personagens são tipos, pessoas comuns e populares naquele local. O filme, então, é uma celebração do povo do Pelô, que tem o seu dialeto próprio, sua identidade como um estilo de vida.
E é aqui que surge o maior problema do filme: a caracterização dos personagens se mostra um tanto carregada. Realmente, as pessoas daquele local falam de forma arrastada, são desbocadas, escrachadas e têm um molejo natural no corpo, sim. Mas chega um momento que isso parece vir de graça, só pela simples necessidade de existir na tela.
Mesmo assim, o filme se aproveita desses personagens para construir uma crítica social interessante sobre aquele meio. As religiões que não se entendem (aqui nem as igrejas evangélicas nem o candomblé são poupados), o problema do racismo que ainda persiste, a prostituição que ganha espaço não só local, mas também no exterior, a tentativa de muitos que querem seguir carreira musical na terra do axé e sonham com o sucesso (será que consiguirão?), a mulher que tem um monte de filhos em casa, mas pratica abortos clandestinos, o homossexualismo assumido ou não, a ilegalidade do trabalho informal. E essa crítica toda se acentua ainda mais em contraste com a folia carnavalesca (o final, então, nos deixa algo para refletir).
O time de atores também faz bonito em cena. Nem é preciso mais comentar a sempre ótima atuação de Lázaro Ramos. Mas a surpresa vem por conta dos rostos novos, a maioria do Bando de Teatro do Olodum, e não decepcionam. Destaque para Luciana Souza, que interpreta Joana, dona do cortiço e evangélica fervorosa, e para o travesti de Lyu Arrison, Yolanda . Wagner Moura, infelizmente, aparece num personagem por demais carregado, se mostrando quase dispensável.
As cenas musicais (que contagiam até mesmo aqueles que não curtem o axé) surgem com uma naturalidade muito agradável, já que esse fervor musical parece brotar da alma daquele povo. Povo que pena, mas que não abre mão da folia.
PS: Vale a pena conferir o ótimo comentário que o colega Chuchu (vulgo Ailton Fernandes) fez em seu blog sobre o filme. Recomendadíssimo.
Postado por Rafael Carvalho